quinta-feira, 29 de dezembro de 2011

O representante alienígena

Dias depois do já famoso Santos x Barcelona, o Sirelli me enviou uma entrevista de Xavi, meia do time catalão, publicada no dia do jogo no jornal El Pais.

Só por algumas declarações dele, que destaco abaixo, dá pra entender melhor o sucesso do Barça.


sábado, 24 de dezembro de 2011

Um jogo, uma reflexão coletiva

Santos x Barcelona expôs ao mundo muita coisa, mas principalmente ao Brasil. Suas repercussões comprovam algumas coisas: primeiro, como a TV aberta ainda é fortíssima no Brasil e como ela é crucial para acontecer um debate público. Segundo, como nossa imprensa esportiva é alienada e, por vezes, é pega no flagra. Terceiro, como Neymar é o bode expiatório da vez, para o bem e para o mal.

segunda-feira, 5 de dezembro de 2011

1986



"Tenho também um motivo pessoal para escolher esse jogo. Fui testemunha auditiva de uma ovação inesquecível. Quando as câmeras mostraram Zico se levantando do banco de reservas para entrar em campo, a torcida que acompanhava o jogo, nas casas e apartamentos daquela rua da Tijuca, vibrou como se comemorasse um gol. Ouvi, claro e nítido, aquele rumor indescritível da torcida. Deve ser o que chamam de “a voz rouca das ruas”. Zico jamais soube daquela cena. Mas, a 8.000 quilômetros de distância do México, numa rua da Tijuca, meninos, eu ouvi: nunca a imagem de um jogador se levantando do banco de reservas mereceu tamanha ovação da torcida. Ah, essa paixão tão bonita, tão inútil – e tão brasileira. Por favor, esqueçam que Zico desperdiçou um pênalti." 

Geneton Moraes Neto, num excelente texto em defesa da Seleção de 1986 que você encontra aqui.

Ah, e o goleiro francês pediu desculpas por ter defendido o pênalti...

terça-feira, 11 de outubro de 2011

Pelo fim dos alambrados

Desde criança ouço falar nos hooligans ingleses. Hoje assisto aos jogos do campeonato daquele país estupefato: os estádios não têm alambrado! Os torcedores ficam pertinho dos jogadores e nada acontece, fora os apupos e aplausos. Como é possível?

A mais recente vítima de nossos hooligans é João Vitor, volante do Palmeiras. O que aconteceu na Inglaterra que poderia ser utilizado aqui?

terça-feira, 13 de setembro de 2011

O Flamengo virou timinho

O maior jogador da história do Flamengo sempre fez questão de dizer que jogador algum é maior que o Flamengo. Segundo Zico, os atletas passam, mas a instituição fica. Hoje essa lógica foi transformada.

O homem que comandou as maiores glórias do clube, que é considerado o "Pelé branco", sabe que sempre houve dirigentes incompetentes no futebol brasileiro. E que o Flamengo não estava livre disso.


quarta-feira, 31 de agosto de 2011

A ameaça



O Brasil está num bom momento econômico, a Europa não. Essa seria uma explicação simplista para a notícia Real e Barça, uma ameaça ao futebol espanhol, veiculada no caderno de esportes do Globo, na coluna Planeta que Rola.

Fora a questão da falta de patrocínios nas camisas dos demais clubes, um ponto não foi levantado no texto: as verbas de TV. O modelo espanhol é o mesmo adotado aqui com a implosão do Clube dos 13: cada clube negocia individualmente com a emissora que transmite os jogos. Claro que Barcelona e Real Madrid recebem muito mais que outros clubes, graças a sua audiência.

A diferença é que, na Espanha, esse modelo já vigora há tempos, enquanto no Brasil está apenas começando. Mas alguém duvida que possamos seguir o mesmo caminho, com Flamengo e Corinthians se revezando nos títulos nacionais?

sexta-feira, 19 de agosto de 2011

Ao torcedor, o que ele merece

De todas as repercussões da publicação do perfil de Ricardo Teixeira na revista Piauí, a que mais me espantou foi o protesto que as torcidas organizadas estão organizando para a próxima rodada do Brasileirão. O espanto se dá em duas frentes: 1) torcidas organizadas unidas por uma causa; 2) a causa ser um protesto político.

Ricardo Teixeira não imaginava que uma revista mensal de classe média, com páginas e mais páginas de texto, pudesse ser tão citada por aí afora. Ser amigo da Globo ajuda em muitas coisas, mas não se pode ignorar a presença das redes sociais espalhando informações. É assim que muitos protestos coletivos começam a surgir - vide o mundo árabe e a Inglaterra. Foi assim que tanta gente ficou sabendo do que ele falou.

domingo, 17 de julho de 2011

Tia Bola e as lições da Copa América


- Meninos, meninos, que tristeza é essa? Não se pode ganhar todas, seus papais técnicos não ensinaram isso a vocês? Vamos para a nossa atividade de hoje. Quero que cada um levante e conte pra tia Bola o que vocês aprenderam com a Copa América. Júlio César, já que você é o camisa 1, pode começar:

- Eu aprendi que tenho que ser menos marrento, senão vou ficar que nem o Rogério Ceni: mala e frangueiro no fim de carreira...

- E...?

- ... e que tenho que conversar mais com a Susana pra não ser pego de surpresa no Twitter.

- Muito bem. Daniel Alves, e você?

- Eu aprendi que a Seleção não é o Barcelona, e que os campeonatos que eu disputar com a camisa amarela não serão moleza que nem o espanhol... Tia, olha o Maicon, ele tá rindo!

- Maicon, por favor! Você já saiu no lucro, né? Nada de bullying com os coleguinhas. Lúcio, e você, que cara é essa?

- É minha cara de sempre, ué. Humpf.

- E o que você aprendeu com a Copa América?

- Eu já sabia tudo. Eles é que não aprenderam nada. Mas eu avisei.

- Ai, ai, ai... Nada de beicinho, tio Dunga não está mais aqui. Senta e pensa no que você falou. Thiago Silva.

- Aprendi que pênalti não é loteria.

- Muito bem. André Santos e Elano, nem precisam levantar, né?

André Santos e Elano engolem o choro.

- Lucas Leiva, e você?

- Eu aprendi que a Seleção não é o Grêmio. Que não importa o quanto eu jogue bem, se eu bater nos coleguinhas a torcida não vai me aplaudir.

- Gostei de ver. Ramires?

- Tia Bola, eu aprendi que posso ser um volante diferente. Posso atacar e marcar sem bater.

- É, nesse último ponto você ainda tem que ficar mais esperto. Mas tá caminhando. Ganso?

- Eu aprendi que na Seleção eu não posso reclamar de salário e nem ficar falando que vou pra outro time.

- E a tia espera que você não tenha esquecido do que já sabe, né? Robinho?

- Eu aprendi que Seleção não é funcionalismo público, e que se eu não jogar bem e não chamar a responsabilidade por ser um dos veteranos, vou pro banco.

- Muito bem, Róbson. Afinal, nada mais humilhante que ser reserva do Jádson.

Os meninos se entreolham, constrangidos, procurando Jádson.

- Não se preocupem, meninos, o Jádson deve estar por aí com o empresário, que nem deixou ele tirar o uniforme. Neymar?

- Eu aprendi que na Seleção eu não sou o cara que tem que resolver tudo, apesar do que tio Muricy e tia Crônica Esportiva me disseram esse tempo todo. E não esquecer do que disse tio Dodô.

- Dodô, não. Dadá! "Não existe gol feio..."

- ... feio é não fazer gol".

- Isso, quero que você escreva cem vezes no seu caderno e me traga na próxima competição oficial. Pato?

- Eu aprendi que, se eu não namorar a filha do Ricardo Teixeira, não adianta nada jogar mais ou menos.

- Esses hormônios... Fred?

- Eu aprendi que eu já tinha que ter aprendido a jogar na Seleção.

- Lucas Silva, você tá me ouvindo? Fica de cabeça baixa o tempo todo...

- Tô, tia Bola. Eu aprendi que tenho que amadurecer muito, pra ganhar corpo e a camisa da Seleção não ficar tão pesada.

- Ah, meninos, espero que vocês não se esqueçam dessas lições, viu? Quando chegarem em casa, lembrem ao papai Mano que tio Muricy fica espalhando que eu puno, etc e tal. Aquele é outro que merecia voltar pra sala de aula. A culpa nunca é dele!

sexta-feira, 15 de julho de 2011

Haja paciência!


Oito ou oitenta. Parece que o mundo navega entre esses pólos, seja qual for o assunto. Inseridos na cultura consumista e imediatista, da satisfação pessoal agora e já!, descartamos os processos de maturação pelos quais todos nós passamos.

A Seleção Brasileira atual não está jogando mal como se diz. Como a memória nunca é nosso ponto forte em momentos de paixão impulsiva, lembrem que os eleitos de Dunga já empataram com a Venezuela, os de Felipão perderam pra Honduras, os de Parreira perderam pra Bolívia...

São muitos os exemplos de atuações bem mais vexaminosas e preocupantes da Seleção. E o que isso significou mais pra frente? Nada que fosse consequência direta dessa fase. Felipão levou a Copa, Dunga perdeu. Parreira levou nos pênaltis.

O denominador comum a todos esses momentos acontece também agora: todas essas Seleções Brasileiras foram amadurecendo com o tempo. Por mais que você discorde da filosofia de trabalho de cada treinador, não há dúvida que, com o tempo, os times foram ganhando uma "cara".

Eu me pergunto por que tanta pressa pra Mano Menezes e cia. serem perfeitos. Ok, entendo que é uma grande expectativa diante da qualidade atual dos jogadores. Mas o Brasil de 1958 começou a Copa com Pelé e Garrincha no banco. O de 1970 garantiu a ida ao México num 1 x 0 suado contra o Paraguai, num Maracanã lotado. E vocês acham que a mítica Seleção de 82 se fez da noite pro dia?

Vamos baixar a bola. Pela primeira vez, podemos dizer que há qualidade em TODOS os setores do time. Volantes que não só marcam como tocam bem na bola, versatilidade do meio-campo pra frente... Saudades de Mauro Silva, Felipe Melo, Doriva, Afonso Alves?

Concordo com o capitão Lúcio: apesar disso tudo, é preciso seriedade. E raça. Sem esses dois atributos, não há talento que se sustente. A displicência de Daniel Alves e Robinho não se justifica. Nesse ponto devemos cobrar desde já.

Mesmo que sejamos desclassificados domingo, o trabalho de Mano está em processo. E ainda nesse patamar, dá gosto de ver uma Seleção que não briga com a bola. É muito talento junto, com um técnico que quer investir nesses talentos. Não é isso que pedimos desde sempre?

Aí vem o oito ou oitenta, no quesito paciência. Uma geração mimada que tem tudo à mão não aguenta esperar. É o que nós somos nesse começo de século 21, e projetamos essa personalidade em tudo - até no torcer pela Seleção.

Parece que Ganso e Neymar assinaram um contrato escorchante para jogar o fino durante os 90 minutos de todos os jogos. Na primeira balançada dos dois, já os descartamos. É nossa verve consumista falando alto. #foraneymar nos Trending Topics depois de dois jogos ruins do atacante é dose cavalar.

E pior que as viúvas de Dunga são as noivas de Muricy.

segunda-feira, 6 de junho de 2011

Petkovic, eterno e simples


Não fui à despedida do Zico. Mas fui à do Pet. Acho que isso resumiria o post inteiro, né?

Como tantos fizeram no dia 27 de maio - dez anos do gol contra o Vasco, que o imortalizou na galeria dos ídolos rubro-negros - lembro de onde estava naquele dia inesquecível. Na casa da minha tia, em Cabo Frio, e aos 43 do segundo tempo saí correndo e chutei um balde que rolou escada abaixo, fruto de pura alegria. Só minha tia não ficou alegre, ora essa.

Ainda veio o renascimento quase messiânico de Petkovic no Brasileirão 2009 que nem a sua marra em 2010 pôde apagar nos corações flamenguistas. Depois da geladeira de Luxemburgo (o Pet não poderia ter sido opção de banco nesse tempo todo?), resolvi que na despedida eu estaria.

Parecia predestinação, já que um dia antes de comprar o ingresso ele veio até minhas mãos por um colega da pós. Tinha sobrado, e lá fui eu no domingo, sozinho (como há muito não fazia), assistir, duvidoso porém respeitoso, à última atuação de Pet.

A dúvida era por não saber se seria uma despedida ridícula (como a de Maradona gordo no Boca Juniors, ou Gornaldo na Seleção), mas nunca faltaria com o respeito pelo que Petkovic já fez pelo Fla.

Vi o trem lotado de pessoas das mais variadas idades. À minha frente, na fila para entrar, um casal com o neto, todos paramentados com camisas e bandeira, máquina digital, saídos três horas antes de um lugar longe do Rio. Não eram o tipo de torcedor que acompanha todos os jogos. Era a força do ídolo.

Um Engenhão lotado como eu nunca vi, e Petkovic mostrando que teria vaga no time, não fosse a idade pesando. Eu, sozinho na multidão, presenciando tudo aquilo. Não foi uma atuação de gala, não foi um jogo sensacional, sequer foi vitória do Flamengo. Mas eu estava lá.

Quando Petkovic deu a volta olímpica agradecendo a cada canto do estádio, tenho certeza que olhou pra mim e disse "obrigado". E sei que cada uma das 42 mil pessoas sentiram o mesmo. Além do talento e do rubro-negrismo adquirido, Pet tem carisma - sem o qual nenhum ídolo se sustenta.

Não vi a despedida de Pelé, nem a de Zico. Mas vi a de Petkovic. E mesmo nesse último suspiro de seu futebol (por vontade própria e "por cima"), estavam lá representados os elementos que fazem a graça do futebol: torcida que vai pra torcer e reverenciar um ídolo; o ídolo, por sua vez, reunindo talento, disposição e carisma. E ambos, em paixão sadia, reconhecendo mutuamente a importância um do outro para aquele relacionamento de sucesso.

Números, resultados por si só, táticas, técnicos sabe-tudo, dirigentes, marketing, elitização dos estádios, violência... Nada disso fica na memória. Mas um golaço de falta aos 43 do segundo tempo, acompanhado de tudo o que um Petkovic foi capaz de proporcionar para o Flamengo... lota um estádio dez anos depois.

E eu estava lá!

segunda-feira, 16 de maio de 2011

O luxo de Patricia, a patricinha de Luxa


Nada poderia ser melhor para Patricia Amorim do que a vinda de Vanderlei Luxemburgo. Nada poderia ser melhor para Vanderlei Luxemburgo do que a gestão de Patricia Amorim. Ambos possuem projetos de poder distintos, mas que se complementam - e dependem um do outro.

Patricia está no terceiro mandato como vereadora inexpressiva no Rio de Janeiro. Nenhum projeto de lei seu virou destaque, e sua base eleitoral é em parte da Zona Sul. Na campanha para presidente do Flamengo, teve a estratégia mais correta: buscou votos de quem realmente decidia, os sócios do clube. Delair Drumbosck ganhou um título que não aparecia por 17 anos, trouxe Adriano, valorizou Andrade mas nada disso adiantaria, pois a nação rubro-negra não é associada.

Ex-nadadora do clube, Patricia prometeu retribuir o apoio dos esportes olímpicos à sua candidatura, assim como a melhoria nas instalações sociais do clube. Faturou fácil a eleição. Mas depois, vieram os problemas: não tinha equipe suficiente para gerir o clube (Michel Levy e outros acumulavam vice-presidências) e não entendia nada de futebol - a ponto de seu marido tricolor acompanhá-la nas reuniões que decidiam sobre o esporte.

A partir da vinda de Zico, sua habilidade política veio à tona. Surfou na popularidade de ter trazido de volta o ídolo máximo do clube. Quando o Galinho passou a querer levar a sério o cargo, os interesses dos grupos políticos do Fla foram estremecidos. Os empresários já não tinham mais vez (Deivid e Diogo são patrimônio do clube, sem intermediários), e aí começou o processo de "omissão planejada" que é característica de Patricia.

Nas entrevistas e pronunciamentos, Patricia dizia que Zico tinha toda autonomia. Ela disse isso até no dia em que o movimento "Com Zico pelo Flamengo" fez uma manifestação de apoio na Gávea. Mas ao ouvir as entrevistas de Zico, percebia-se o oposto: o "timing" das contratações era prejudicado, por exemplo, pela falta de integração entre as vice-presidências envolvidas.

Pra se ter uma ideia, para contratar Ronaldinho tudo funcionou perfeitamente: presidente, vice de futebol e de finanças trabalhando juntos e afinados. Que diferença dos tempos de Zico clamando sozinho no deserto - e sendo cobrado por isso.

Completando o trabalho maquiavélico, Patricia sumiu de cena e deixou Leonardo Ribeiro, presidente do Conselho Fiscal, para liderar o processo de "fritura" de Zico. Muito mais conveniente: ex-líder de torcida organizada e com aquela cara de Zeca Urubu, todo o ódio da torcida e dos críticos seria canalizado nele, e não na mandatária do clube. Ah, e Leonardo é funcionário do gabinete de Patricia na câmara.

Quando Ronaldinho veio, Patricia não saiu do seu lado até o craque começar a ser questionado. A partir daí, sumiu novamente e só reapareceu pra sair na foto dos títulos conquistados, ainda em campo. Associando seu nome e sua presença só a boas notícias, agora é virtual candidata a vice-prefeita do Rio de Janeiro numa possível candidatura à reeleição de Eduardo Paes. Caso ele saia dois anos depois pra tentar ser governador, Patricia viraria prefeita do Rio! Pra quem até o ano passado era uma vereadora obscura...

O fator Luxa

E onde entra Luxemburgo nisso tudo? Bom, ele não esconde de ninguém que quer virar manager de futebol. É assim que se defende das acusações de ingerência em contratações, ou de querer mandar nos departamentos de futebol dos clubes que o empregam. Usa até o exemplo de Alex Ferguson, do Manchester United.

Esse "projeto", como ele gosta de dizer, tinha tudo pra evoluir no Atlético-MG. Mas, assim como Zico,  sofreu com os resultados desfavoráveis em campo. Luxemburgo chegou a um Flamengo acéfalo no departamento de futebol, na comissão técnica e com uma presidente que não interfere simplesmente porque não tem competência pra isso. Era o cenário perfeito.

Com uma vaidade extrema que sempre o caracterizou, Luxemburgo adora ser o centro das atenções, muitas vezes funcionando de pára-raio sem querer - como no caso Adriano. O funcionário ideal para Patricia e seu conjunto de omissões planejadas e aparições públicas quando convém.

Outro ponto em comum entre os dois é a falta de transparência para justificar suas decisões. Enquanto Patricia "dá um perdido" nas peguntas incômodas (que o diga Caio Barbosa, autor da matéria do Extra sobre o balanço do Flamengo), Luxemburgo responde o que quer nas coletivas, além de desviar o foco dos questionamentos mais profundos. Até hoje ninguém viu ou explicou o contrato com a Traffic, em que o técnico foi intermediário crucial, a ponto de chamar a empresa de "nossa parceira".

Tudo isso vai muito bem enquanto o Flamengo vence dentro de campo. O déficit contábil, a falta de patrocínio master, posições carentes no elenco... Nada disso está caindo na conta de Patricia e de Luxemburgo - até agora.

Só que o Brasileiro de 2011 promete ser um dos mais difíceis dos últimos anos. E uma lembrança tanto dos céticos como dos supersticiosos: Luxemburgo foi campeão mineiro em 2010 com o Atlético-MG...

terça-feira, 3 de maio de 2011

Cuca é o melhor técnico do Brasil

Aquele chorão?

Aquele que perdeu um monte de títulos na final?

Aquele que só tem um título expressivo na carreira?

Esse mesmo.

Ao contrário de tantos renomados "professores", Cuca é o único que ainda sabe fazer o básico: montar um time. Tanto no São Paulo (que chegou à final da Libertadores) quanto no Botafogo e no Cruzeiro, Cuca chegou no início da temporada, foi revelando jogadores desconhecidos com outros mais famosos, dando o equilíbrio necessário.

E mais: Cuca sempre dá um jeito de colocar os craques pra jogar na posição deles. Você imaginaria um time titular com Roger e Montillo? "Não, dois meias enfraquecem a 'pegada' do meio-campo! É fragilizar demais a defesa!". Pois o Cruzeiro nem sentiu isso em 2011.

E ainda tem Gilberto, já nos seus 30 e poucos. "O cara não aguenta jogar de lateral! Vai ser um peso pro time!". Mas tem talento, se cuida, é comprometido. Tem que jogar, e está jogando muito bem. Graças ao Cuca.

Enquanto muitos técnicos arrogantes gostam de dizer o tempo todo que sabem de futebol, que os jornalistas que os entrevistam não sabem de futebol, que no futebol não pode isso e nem aquilo, Cuca (e sua eterna cara triste) prefere trabalhar arduamente. Treina, experimenta, não se rende às soluções fáceis e óbvias. Não precisa ficar ressaltando que sabe, mostra que sabe.

Honrando as tradições do futebol brasileiro, seus times são ofensivos, goleadores, impiedosos. Se o campeonato mineiro não é parâmetro, veja o estrago que o Cruzeiro fez na Libertadores. Pode até cair no mata-mata. E daí? O Barcelona caiu na Liga dos Campeões em 2010 e ninguém questionou seu método de trabalho.

O problema é que Cuca ainda não tem um caminhão de títulos. Aí, ele não pode ser classificado como o melhor do Brasil. Concordo que é um critério que deve ser levado em conta. Mas o que é feito hoje são dois pesos e duas medidas. Muricy comete atentados terroristas com o futebol de seus times, mas como é 500 milhões de vezes campeão brasileiro, dane-se a qualidade do que ele apresenta.

E diante desse quadro todo, Cuca ainda mostra que é corajoso. Não muda sua maneira de ver o futebol mesmo que tenha ganhado um rótulo de chorão, que não seja reconhecido, que não ganhe tantos títulos. A tentação contínua é render-se ao óbvio, encher o Cruzeiro de volantes e pronto, será aceito na maçonaria do bom futebol.

Mas assim ele não quer. Seria falsidade ideológica. E contra tudo e contra todos, Cuca prossegue fazendo o que acha melhor pra ele - e pro futebol.

Qual time com Wallyson, Ortigoza, Diego Renan, Brandão seria favorito para o título da Libertadores? O time de Cuca, claro.

sexta-feira, 29 de abril de 2011

Reizinho de corpo, alma e caráter


Não sou vascaíno. Mas se alguma vez gostaria de ter sido foi naquela virada histórica contra o Palmeiras na final da Copa Mercosul de 2000. Foi exatamente o que pensei quando Romário fez o quarto gol: ''Caramba, se eu fosse vascaíno estaria orgulhoso agora".

Aquela virada começou aos 15 minutos do segundo tempo (!), com um gol de Juninho Pernambucano, num chute que misturava técnica e raça, como foi sua comemoração. Sequer correu afobado para dentro do gol a fim de recomeçar logo o jogo, precisava curtir aquele momento com a torcida. Garra e atitude de um jogador querido e decisivo.

Juninho não teve marra nem quando merecia ser titular absoluto na Copa de 2006. Injustiçado como Ademir da Guia (que disputou apenas uma partida na Copa de 74) o Reizinho fez um gol contra o Japão e não voltou mais ao time. Se estivesse em campo contra a França, sua raça e seu comprometimento poderiam ter reescrito a história daquele jogo.

Um dos poucos jogadores eternizados em música de torcida mesmo após sua saída (pelo seu gol contra o River Plate, na Libertadores de 1998, "sensacional"), Juninho agora retorna ao Vasco ensinando a muito me(r)dalhão por aí o que é ser ídolo.

Claro que ninguém é obrigado a voltar para o Brasil ganhando, literalmente, um salário mínimo. Mas o pŕoprio craque dizer, publicamente, que não tem vaga cativa no time, que só vai jogar se estiver rendendo o necessário, é coisa raríssima. Talvez só Ronaldo Angelim se porte dessa maneira, mas está a anos-luz do talento de Juninho.

Ele poderia ter dito isso tudo ao treinador, nos vestiários. Mas dizer aos quatro ventos é porque sabe que o mais importante é sua palavra, acrescida da credibilidade necessária. Juninho não tem medo de ser cobrado, e para isso abre o jogo e coloca tudo nas devidas proporções. Foi transparente até na questão da concentração.

Seu mote é fazer a alegria da torcida, e uma dessas condições é não dar prejuízo ao clube, dentro ou fora do campo. Pra quem teve recentes experiências com "Cazalbertos" e afins, é uma prova de amor e tanto.

Ao agir assim antes mesmo de chegar, Juninho mostra que tem um caráter acima da média dos boleiros de seu tempo. Dá um exemplo tremendo para os jovens cruzmaltinos e coloca em xeque as loucuras via marketing ou cotas antecipadas de TV que os dirigentes de clubes teimam em fazer. E que os egoístas medalhões aceitam sem pestanejar, nem aí pra relação com torcida ou coisa que o valha.

E como se tudo isso fosse pouco, ao dizer tudo o que disse na sua volta à Colina, Juninho me fez pensar novamente: se eu fosse vascaíno, que orgulho eu teria agora.

segunda-feira, 14 de março de 2011

Chegou a hora de importar?


Falta técnico no Brasil.

Essa é a minha conclusão ao ver que os comandantes dos principais times do país não são unanimidade, suas decisões dentro e fora de campo são ininteligíveis, passíveis de questionamento até pelo mais irracional torcedor.

Esses mesmos técnicos não sabem lidar com a imprensa, com críticas, com diretorias. Todos, na hora da contrariedade, viram crianças pirracentas na entrevista coletiva após os jogos.

Luxemburgo, tão elogiado na carreira por sua capacidade de montar esquadrões ofensivos e sólidos, patinou com o Atlético-MG e faz o mesmo com o Flamengo, apesar dos resultados. Em ambos os casos, teve carta branca e parece ter esquecido o que sabia. A ponto de se defender apenas com o currículo, nada mais.

Felipão, o último que trouxe uma Copa, foi escorraçado do Chelsea depois de apequenar Portugal nos jogos decisivos (perder a Eurocopa pra Grécia, em casa, é deprimente). Agora, nem no conhecido Palmeiras consegue repetir o sucesso dos anos 90.

Muricy, o atualmente endeusado pela crítica esportiva, dá graças aos céus por terem inventado os pontos corridos. Não fosse isso, dificilmente seria tantas vezes campeão brasileiro. Seus times cheios de falta de imaginação tiram a paciência do mais ingênuo torcedor.

Estamos falando de medalhões que já conseguiram várias glórias. Agora imagine a situação dos que vêm abaixo deles.

Os técnicos brasileiros mostram que pararam no tempo, parecem sofrer de Alzheimer profissional. Como compará-los com Josep Guardiola, José Mourinho, Alex Ferguson, Arsene Wenger?

"Ah, mas esses que você citou têm dinheiro de sobra pra comprar os craques que quiserem!". Sim, mas jogam entre si, enfrentam outros times com o mesmo poderio. Guardadas as devidas proporções, dá na mesma. Compare as decisões de cada um deles com os brazucas.

A falta de criatividade, a teimosia, a inabilidade para lidar com críticas e com os atletas, o despreparo na relação com a chefia são traços marcantes da grande maioria dos técnicos brasileiros. E pior: sem evoluir no campo, apenas plagiando as piores influências do estrangeiro (nunca as melhores).

O cenário de indigência é tamanho que um amador como Dunga conseguiu ficar 4 anos à frente da Seleção sem ser seriamente ameaçado por ninguém. Muitos queriam que ele saísse (eu inclusive), mas quem colocariam no lugar, com absoluta segurança?

Chegaremos ao ponto de ter que importar técnicos?

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2011

Luxemburgo, esse enigma

Além de títulos, tudo o que o Flamengo precisava nesse começo de ano eram boas notícias e tranquilidade para trabalhar. Então 2011 começa bem, nem derrota o time conheceu ainda. O que me deixa intrigado é uma dúvida sincera que me acomete a cada rodada: o que se passa na cabeça de Vanderlei Luxemburgo?

A pergunta não é provocativa, como se eu já insinuasse que não se passa nada. Eu realmente gostaria de saber como anda o raciocínio do técnico diante do Flamengo que ele vem montando, quais as conclusões, para onde caminhar. Vendo as entrevistas de Luxa não consigo chegar a alguma conclusão. Apenas levanto hipóteses, que compartilho aqui.

Luxemburgo sempre rebate asperamente quaisquer críticas a seu trabalho (e quanto mais ele repete que as respeita, mas ressalta que as odeia). Assim como não admite estar errado, movido a vaidade. Não é de hoje, e nem é o único técnico no mundo a agir assim.

Se insinuam que a defesa rubro-negra precisa de reforços, ele argumenta que é a defesa menos vazada, então o questionamento não faz sentido. Se levantam a possibilidade do time estar sem padrão tático e sem convencer em campo, ralha sobre movimentação, liberdade, variações de esquema que o elenco permite.

Minha dúvida é (e minhas hipóteses são): Luxemburgo diz essas coisas para preservar o grupo ou por realmente acreditar nisso? Se for a segunda hipótese, o Atlético-MG de 2010 surge como um fantasma que ronda a Gávea.

Ano passado, Luxa teve carta branca da diretoria, tinha um bom elenco, com jogadores valorizados em 2009. E não conseguiu fazer boa campanha no primeiro campeonato "pra valer", ou seja, o Brasileirão. Mas foi campeão estadual, o que lhe deu fundamentos para achar que estava no caminho certo.

Com o Flamengo ainda patinando para vencer seus adversários no Carioquinha (pergunte ao rubro-negro se ele sente confiança no time), como será na hora de encarar grandes forças do futebol brasileiro? (Ok, teve o Botafogo, mas o jogo foi empate. O Vasco ainda "fritava" PC Gusmão naquele 2x1).

Se for campeão estadual ainda desse jeito, o torcedor se sentirá seguro para o cada vez mais equilibrado Campeonato Brasileiro? Lembremos que o estadual do Rio já foi apelidado de "Me engana que eu gosto", pelo próprio Flamengo sendo campeão e depois brigando contra o rebaixamento.

E volto à minha dúvida: será que Luxemburgo está realmente satisfeito com o que vê em campo? A ponto de achar desnecessário mudanças ou reforços? A certeza do técnico ainda é ambígua, o que traz calafrios à torcida.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

O berço é um lugar inesquecível


Sábado resolvi quitar uma dívida com meu passado. Mal sabia eu que estava indo ao encontro das raízes do futebol, ainda vivíssimas, apesar de tudo.

Na entrada, a bilheteira Rosane informa que o ingresso é R$ 10,00 a inteira. Não entendi quando vi o valor de R$ 20,00 impresso. "É que o Maciel dá uma força, e aí a gente cobra esse valor". Maciel é o atual presidente do São Cristóvão, que naquela tarde jogaria com o Aperibeense pela Série B do Campeonato Carioca. Um subsídio do comandante para aumentar o número de presentes.

Chego às 16h30, está rolando a preliminar com os juniores. Atrás do gol fica a velha guarda da "torcida cadete", apelido do clube que fica próximo ao CPOR, de formação de cadetes do exército. Um deles usa a camisa do Tabajara F.C.; outro, o único jovem do grupo, veste a número 2, toda rosa (as cores do São Cri-Cri são preto, rosa e branco). Os demais são o estereótipo dos velhinhos de fila de banco - a ranzinzice dessa vez se manifesta, claro, contra o trio de arbitragem.

A sala de troféus está fechada, mas não é tão vazia como se imagina. Na porta, uma foto ilustrada do time do último título: o Campeonato Estadual de 1926 - simplesmente o ano em que minha única avó ainda viva nasceu. Ao lado, a estátua do padroeiro dos motoristas, que dá nome ao clube.

A cantina humilde lembra aquelas de escola: os clássicos (e massudos) joelhos, refrigerantes e biscoitos mil. Uma televisão, ironicamente, mostra Ronaldo falando de sua carreira. É notório o contraste do conforto milionário do filho ilustre com a ferrugem da lâmpada e os azulejos antigos. O gramado, não faz muito tempo, era mantido rentinho ao chão graças ao profissionalismo de várias ovelhas.

A torcida tem cerca de 50 pessoas, também de todas as idades, algumas mulheres. Uns garotões fazem uma rodinha no último degrau da arquibancada e se comportam como se o jogo do gramado à sua frente acontecesse na TV: conversam mais do que torcem, deixando pra se manifestar nos lances de perigo e pra xingar o bandeirinha que fica a dez passos do público. Assim como os bagunceiros da classe, zoam qualquer figuraça (que eles julguem assim) do local. Um jovem de cabelo alto e barba pelos lados da mandíbula já é acolhido: "Fala Wolverine!" Uns CDFs podem ter se juntado ao grupo: "Parece o Dom Pedro I. Ô império brasileiro! Poder Moderador!". A impressão é que, num bairro com poucas opções de lazer, os jogos do São Cristóvão são um "point" da galera.

Atrás da arquibancada de cinco degraus, há um campo de futebol soçaite que os times usam pro aquecimento. Tudo a céu aberto, a não ser os "camarotes": bancadas do prédio administrativo que fica atrás do gol. Um baixinho com bigode de Hitler e temperamento idem parece ser o zelador. Arrumou confusão com o time inteiro do Aperibeense que ousou aquecer-se de chuteiras, e não de tênis, no campo soçaite. Principalmente com o camisa 11, que lhe pareceu atrevido. "Tu viu a atitude dele? Eu não gostei foi da atitude", dizia, justificando seu zelo. Mais tarde ligou pro presidente do clube - o Maciel - perguntando se um sócio que usava  camisa do Flamengo poderia continuar nas dependências do clube. Parece ofensa mesmo: estádio pequeno e ainda tendo que dividir com os outros? Depois, outra aporrinhação: "Cadê a ambulância??", gritava no rádio para os responsáveis por trazer o equipamento indispensável em qualquer jogo, seja de que divisão for.

Acima de uma pretensiosa tribuna de imprensa, a única publicidade do estádio está pintada na parede: "Pousada Locomotiva 206, em Conservatória".

Celso, um barbudo que lembra os personagens das histórias de Asterix, já está rouco na preliminar. Sabe o nome de todos os jogadores, mesmo da categoria junior (para azar dos atletas). Parece ser da diretoria. Ao seu lado está Raimundo, historiador informal do clube: já escreveu dois livros sobre o São Cristóvão. Um conta as memórias do título de 1926; outro, a trajetória dos Cadetes até os dias atuais. Não se manifesta muito, mas quando o bandeirinha marca um esquizofrênico impedimento após cobrança de lateral, parte pro alambrado pra espinafrar a árvore genealógica do árbitro auxiliar.

Sentado sobre uma almofadinha, daquelas feitas pro arquibaldo clássico, está Marcus Vinicius. Camisa do São Cristóvão comprada numa feira de colecionador, boné com cara do primeiro que viu pela frente antes de sair de casa, chinelos. Está acompanhado do filho, Marco Túlio, de 11 anos, moreno, cabelos pretos e inquieto com a aventura da Figueira de Melo. Nas mãos do garoto, um pedaço de papelão com o escudo do clube desenhado à mão com caneta Bic e a inscrição "Vamo ganhar".

Por que torcer pro São Cristóvão? "Somos botafoguenses, mas o segundo time é o São Cri-Cri, pois vários parentes na família eram torcedores fanáticos do clube", conta Marcus Vinicius. O filho já está no alambrado saudando a entrada do time profissional com seu cartaz estilizado. Vai passar o jogo inteiro em volta do campo e pelos camarotes pra acompanhar o time. Quando o pai pergunta por que ficou atrás do gol que o São Cristóvão defendia, em vez de acompanhar os ataques e possíveis gols, responde maroto: "Eu tava xingando o juiz".

Marcus também é um colecionador de revistas sobre o Campeonato Carioca, tem exemplares desde 1940. Fala das agruras de ser da segunda divisão: "Pro São Cristóvão ser campeão, tem que disputar 42 jogos até o fim do ano. É mais do que o Campeonato Brasileiro da Série A, que são 38 partidas". Lembra de 1973, quando seus dois times estiveram em rodada dupla no Maracanã. Na preliminar, o Botafogo perdeu de 2 x 0 para o Bonsucesso. O jogo principal era São Cristóvão x Flamengo, e os rubro-negros que tinham sacaneado os botafoguenses tiveram que aguentar a roda da fortuna: 1 x 0 pros Cadetes, no Maracanã lotado.

O jogo parece fácil pros donos da casa. O Aperibeense arma uma retranca e não consegue acertar passes fáceis, que dirá contra-ataques perigosos. Logo os bagunceiros o apelidam de "Aperebeense". Celso parece o próprio técnico do São Cri-Cri. Como todo torcedor fanático, sente que está diante de nada menos que a final do Mundial Interclubes. "Ele é muito nervoso!", ri Marcus Vinicius. Conta que um dia o São Cristóvão perdeu de 4 x 0 pro Bonsucesso (que algoz!) e Celso ficou deprimido, as pessoas o chamavam para ir embora e ele não ia, ficou um bom tempo na fossa que uma derrota acachapante pode causar. Marcus estranhou. "Achei que ele estivesse acostumado. Ultimamente, pro São Cristóvão a derrota é o normal".

Segunda divisão não discrimina ninguém, nem nas fatalidades. O camisa 11 do Aperibeense tem um mal súbito e desmaia sozinho no canto do gramado. O pequeno Hitler chama a ambulância (não se sabe se pensou "Deus castiga atrevimentos" nessa hora). Entra em campo um casal de enfermeiros, ele magro e ela gordinha. Os bagunceiros, honrando as tradições escolares, não perdoam. O camisa 11 levanta, aparentemente sem problemas. Daí em diante os bagunceiros só vão chamá-lo de Padiola.

O primeiro tempo termina 0 x 0. A maioria dos presentes vai à cantina. Marcus Vinicius e Marco Túlio dividem um Guaraviton (patrocinador do Botafogo) e comem um joelho cada um. "Tá frio", reclama o pai. O São Cristóvão parte pra cima no segundo tempo. O camisa 18 entrou e animou a partida, criou várias jogadas, driblou, causou cartões amarelos. Os Cadetes erram o alvo, pra tortura de Celso: chutam pra fora na pequena área, cabeceiam na trave, quase gol olímpico... Na improbabilidade do futebol, o Aperibeense arma um contra-ataque, o quarto-zagueiro da casa capota no ar e a bola sobra pro Padiola, de cara pro goleiro, quase na marca do pênalti - bola pra fora, de maneira inacreditável. Os apelidos parecem fazer justiça.

Um jogador do Aperibeense é expulso, aparentemente de maneira infantil. (Assistir qualquer jogo ao vivo expõe como nossas certezas são eternamente dependentes do replay). Os próprios colegas parecem não ter gostado, principalmente o Padiola. Na parada técnica, o camisa 11 arruma briga com o time inteiro, não dá pra saber por quê (repórter de campo também faz falta). Parecia plenamente recuperado do mal súbito.

Faltando menos de dez minutos para o fim, o São Cristóvão consegue uma falta perto da área. Cruzamento e... gol! Do camisa 7, um branquinho e loirinho batizado de "Garoto Juca" pelos bagunceiros. Até o fim do jogo vai ser um sufoco, já que o time da casa recua e o Aperibeense vai pro desespero. O lance mais incrível acontece fora de campo: Celso vai embora antes da partida terminar.

No apito final, aplausos aos vitoriosos. Marcus Vinicius e o filho vão em direção à saída de campo dos atletas. O garoto quer tirar fotos com os jogadores. Nenhum deles é famoso ou já apareceu na TV.

Nasci no Engenho Novo, mas fui criado no bairro imperial de São Cristóvão. Morei na Rua São Luiz Gonzaga, depois no Campo de São Cristóvão, estudei no Colégio Pedro II, corri e joguei bola na Quinta da Boa Vista. Só saí de lá ao casar, já com 27 anos.

Só que cometi um pecado imperdoável para um autêntico morador que adora futebol: nunca tinha ido ao acanhado estádio da Rua Figueira de Melo assistir a um jogo do São Cristóvão Futebol e Regatas.

Ao pagar essa dívida, acabei indo ao encontro da gênese do esporte. Ou como já foi dito por alguém, do "futebol em estado puro". Naquela tarde de sábado parecia ter voltado a 1926, quando não havia TV, marketing, salários milionários, elitização dos estádios, confusões extra-campo. Apenas paixão, fidelidade, empenho, idiossincrasias, dedicação, alegria, tristeza. Sem elementos como esses, não há futebol.

Mas era 2011, portanto não se trata de nostalgia. É justamente a constatação que apesar dos vaticínios propagados (e perpetrados) por várias direções, o futebol não morre, mesmo no acanhado estádio da Figueira de Melo. Só está aguardando as testemunhas.

ATUALIZAÇÃO: blog do Marco Túlio

À direita, os camarotes dos Cadetes
  

O Fenômeno na TV

Bola na área, o "Garoto Juca" (camisa 7, último à direita), se prepara pra subir...

 
... gol do São Cri-Cri!


Outros vão nascer aqui?

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Ser ou não ser ídolo?


À essa altura, até o mais desmemoriado torcedor sabe da importância que Ronaldo teve na história do futebol mundial e, sobretudo, do brasileiro. As retrospectivas protagonizaram o dia (ainda que num tom lamentoso. Parecia que o jogador tinha morrido) e não vou me alongar aqui sobre o que o Fenômeno fez na carreira.

O que eu queria destacar é que, como tantos outros craques, ele era ídolo onde passava. Mesmo quando ficou sem jogar, não sumiu da mídia, nem do coração esperançoso de quem torcia por ele. Mas será que Ronaldo teve a real noção do que é ser ídolo?

Digo isso porque Ronaldo sempre reclamou que o Brasil não trata bem seus ídolos, à medida que as críticas apareciam - sejam sobre o trabalho em campo ou sobre os episódios diversos fora dele.

O problema é que, para Ronaldo, tratar bem significa paparicar. Desde os 16 anos levou uma vida de rei (fruto de seu trabalho, sem dúvida), com toda a corte à sua volta para protegê-lo e passar a mão na cabeça quando preciso. Pra completar, com a Globo capitalizando em cima de seu carisma e tentando blindá-lo para não comprometer a cara imagem.

Só que, como todo ídolo, Ronaldo é humano. E por mais que a religião do marketing tente negar, uma hora essa humanidade vem à tona. Seja numa contusão, num hipotireodismo, num motel da Barra da Tijuca ou no Twitter.

Entretanto, como Ronaldo vive no reino da fantasia (pois uma carreira sem críticas é coisa de ficção), nunca suportou que alguém falasse mal dele. Isso se manifestou até mesmo na hora da despedida. Quando citou a causa de sua gordura e a impossibilidade de perdê-la, quis deixar pesada a consciência de muitos críticos (e torcedores rivais que não perderam o espírito zoador do brasileiro). E ainda disse que não guarda mágoa. Tô vendo...

Todos os ídolos foram criticados em diversos momentos da carreira. E tiveram que lidar com isso, de algum jeito. Zico ganhava motivação pra revidar em campo; Romário rebatia, criando frases inesquecíveis; Garrincha não podia negar o ocaso de seu futebol - assim como Ronaldo agora.

Ronaldo deixa muitas lições para futuros jogadores: determinação, coragem para ser um jogador decisivo, alegria a cada gol marcado. Mas também lembra que ninguém é perfeito ou intocável - nem pode pensar que é. Falta humildade a muitos craques e jovens promessas, e Ronaldo é uma das referências para eles. Nesse ponto, pode ter sido mau exemplo.

E para os míopes de plantão, ressalto: destacar esse aspecto da carreira de Ronaldo não desmerece nem apaga o que ele fez com chuteiras.

segunda-feira, 7 de fevereiro de 2011

Copa 2014: precisamos lembrar do fracasso


Amanhã tem mais um teste para Mano Menezes. Já que a Seleção Brasileira está classificada para a Copa 2014 mesmo, é o técnico que tem que convocar e treinar direito pro Brasil ir jogando bem e assim manter-se no cargo.

No entanto, se quisermos pensar no título em casa, penso ser fundamental contar com  jogadores que já sentiram a dor de uma desclassificação precoce em Copas anteriores. Isso parece ser contrário ao espírito de renovação encomendado a Mano, mas não é.

Nenhuma seleção campeã do mundo teve em seu elenco apenas uma nova geração fissurada em sair com a vitória. Até pela idade dos atletas, sempre é possível ver alguns que choraram por ficar longe da final antes conseguirem comemorar em ocasiões seguintes.

É claro que o critério técnico tem que ser a mola-mestra de qualquer convocação. Mas é preciso, na medida do possível, aliar esse aspecto à experiência. E não falo só de jogadores mais velhos.

Jogadores como Júlio César e Daniel Alves, que sentiram o gosto ruim daquela derrota para a Holanda em 2010, continuam se mantendo em alto nível, justificando sua presença na Seleção. E além do talento e do preparo físico, a "dor de corno" também vai valer muito na hora de uma nova oportunidade para levantar a taça.

São jogadores que já passaram pela pressão de um Mundial e que farão de tudo para não viver a decepção novamente. E vão querer contagiar e conscientizar todo o grupo nesse sentido.

O título de 2002 veio depois de uma derrota categórica em 1998 - Rivaldo e Ronaldo estavam em ambas as ocasiões. Em 1990 lá estavam Taffarel e Romário, cruciais em 1994. 1970 era a chance de Gerson e Jairzinho reescreverem 1966.

Não estou dizendo que a base de 2014 deve ser 2010. Mas o equilíbrio deve acontecer, visando também o aspecto aqui narrado. Kaká ainda não saiu incontestável de uma Copa. Se recuperar a camisa 10, imagine como não jogará a última, e em casa? E Maicon, que parece ter sido o mais raçudo na África do Sul e, ainda assim, perdeu?

A "dor de corno" pode ajudar, e muito.

sexta-feira, 4 de fevereiro de 2011

A perenidade dos Estaduais

Nesse início de ano houve uma discussão mais crítica sobre a importância dos Campeonatos Estaduais. Vozes na internet, na TV e em meios impressos, de diferentes matizes, no mínimo concordaram que essas competições têm saturado os clubes grandes.

A partir daí, muitos simplesmente querem a extinção dos estaduais, privilegiando copas regionais como as antigas Nordeste e Sul-Minas e o Torneio Rio-São Paulo. Outros admitem que os estaduais são extensos e inchados (o que se explica pela politicagem das Federações, precisando dos votos dos times pequenos). Mas, em nome da tradição, estes opinadores não acham que o melhor é o fim.

À parte essa discussão, o que se vê hoje é que o Campeonato Estadual, por se tratar de um título a ser conquistado, possui significados diferentes para cada clube e jogadores, a cada temporada.

Olhando o Rio de Janeiro: para o Vasco, é o começo de uma retomada da credibilidade perdida. Com exceção da Série B de 2009 (que muitos torcedores sequer se acham à vontade pra comemorar), são oito anos sem o lugar mais alto do pódio. Pergunte ao Corinthians e ao Botafogo o que é uma fila, e os seus efeitos no moral da torcida.

Para o Botafogo, o Carioca 2010 foi a superação de um desastre anunciado numa goleada histórica. Foi a recuperação da auto-estima, do respeito por ganhar os dois turnos e não dar chance pra ninguém. Sem o título, dificilmente o Glorioso faria a campanha que fez no Brasileirão.

Para o Fluminense, emendar o título brasileiro com mais outro em seguida pode gerar uma empolgação exponencial para a Libertadores, contagiando time, torcida e mídia.

Mesmo o Flamengo, que desde 1999 venceu seis vezes o Carioca, ganhar novamente em 2011 é o sepultamento do fracasso do ano passado. No caso rubro-negro, a importância do torneio se individualiza: para Luxemburgo, é voltar a ser campeão depois de dois anos - período longo de jejum para o que está acostumado. Para Ronaldinho Gaúcho, a certeza que veio pra somar dentro de campo, com graça e também resultados.

E assim, ano após ano, os Estaduais conseguem renovar o seu interesse de público e crítica. No entanto, é ponto pacífico que eles precisam ser mais rentáveis para os clubes grandes e menos extensos. Não faz sentido disputar final de estadual às vésperas de um jogo de oitavas-de-final da Libertadores já em abril.

Assim, acredito que o segredo é criar um calendário que faça os grandes jogarem mais entre si. Ou de maneira mais decisiva. Os clássicos sempre vão render buxixo, audiência, retorno de mídia, patrocínios, motivação no campo e na arquibancada. Essa foi a receita de Mario Filho, há mais de 50 anos, quando o jornalista se reuniu com os dirigentes cariocas para revitalizar o Estadual do Rio.

quarta-feira, 2 de fevereiro de 2011

Os opostos, o carisma e o iluminado


Era noite de emoção para as duas maiores torcidas do Brasil. Enquanto o Flamengo contava as horas pra festejar Ronaldinho Gaúcho em campo, o Corinthians seguia com Ronaldo para vencer, antes de tudo, o seu próprio nervosismo para passar pelo Tolima e manter viva a Libertadores.

No Brasil, estádio lotado, mosaico, de novo a Gávea volta a ter um camisa 10 de renome, na teoria e na prática. Mas como seria sua volta aos gramados? Fama de baladeiro, chopinho na quadra do samba, muito oba-oba...

Na Colômbia, estádio cheio (não lotado), gramado ruim, camisa 9 que há mais de um ano vive só da fama, engabelando técnicos e torcida, parceiro do marketing e de um presidente falastrão.

Ronaldinho correu, buscou o jogo, deu carrinho, fez suas jogadas de efeito. O Flamengo, desentrosado e ainda desequilibrado entre ataque e defesa, suava pra não levar um susto do quarto melhor time do Rio neste início de estadual.

Ronaldo não conseguia tirar o zero do placar, pênaltis à vista.

O Flamengo botava o coração na ponta da chuteira pra festa não virar pesadelo, não virar mico. O Corinthians se virava pra driblar a redução de seu elenco pro sonho não virar mico.

O Flamengo martelou, tentou, chutou pra fora, substituiu, pressionou. Ronaldinho caiu bem como capitão, se movimentava, incentivava o time, levantava a torcida num "vamoporra!" clássico. Devido ao cansaço, fixou-se na faixa esquerda do campo, deu passes açucarados para finalizações amargas. Cadê a farra, o chinelinho, que mostrariam um R10 se arrastando em campo?

Talvez estivesse em Ibagué, quando o Timão levou um, depois outro. Assistindo tudo lá da frente da outra meia-lua, talvez.

Mas o iluminado nem sempre é o que está debaixo dos holofotes. Assim foi com Fio Maravilha, Nunes, Cocada, Adriano Gabiru, Bujica, Tupãzinho... e Wanderley.

Fim de jogo, estádio ovacionando, hora certa daquela saidinha rápida do gramado depois de ouvir as babaovices dos microfones.

Antes disso Ronaldinho faz questão de cumprimentar Wanderley, o homem que garantiu a sua festa. Depois, agradece a cada canto do estádio, reverencia de volta, mareja os olhos. Quando os homens-óbvios empunham seus instrumentos captadores, flagram um craque que parece ter reencontrado um motivo para ser feliz em campo.

Foi só um jogo do Carioquinha 2011. Mas pergunte ao corintiano se ele não gostaria de trajar vermelho e preto no Engenho de Dentro hoje.


segunda-feira, 31 de janeiro de 2011

It's all about money?


A entrevista do presidente da Traffic, publicada no Globo de ontem, é emblemática do futebol de nosso tempo. Isso porque Julio Mariz esclarece o óbvio: como toda a empresa, estão no negócio para lucrar. Nada de absurdo nisso, é a natureza das empresas. Mas como o produto em questão é algo arraigado à identidade nacional e à paixão amadora, tudo fica mais complicado.

Julio fala com naturalidade sobre o fato de jogadores terem empresários desde os 14 anos, e explica como os grandes clubes perdem (ou rasgam) dinheiro sem uma gestão adequada. Sai muito pela tangente quando questionado sobre o fato da Traffic operar em todos os clubes da Série A acabar gerando um conflito de interesses.

Triste é constatar que, assim como já acontece em muitas outras esferas, quem não tem o poder de consumo exigido, ficará de fora da brincadeira. Parece que o único caminho da sustentabilidade dos clubes (e dos lucros de empresas como a Traffic) passa pelo torcedor-cliente.

Quem não puder comprar os produtos licenciados, os ingressos caros, os carnês de sócio-torcedor estará excluído da história do seu time de coração. "Ah, mas é assim no mundo inteiro!", é a frase evocada como um mantra inconstestável.

Fico impressionado em como nos acostumamos a aceitar determinadas situações com uma passividade gritante. É claro que os clubes precisam encontrar meios de subsistir e serem competitivos, e as regras do jogo não são as mesmas do tempo de Pelé e Garrincha. Mas por que achamos que a elitização pura e simples é a solução final?

Por que em nenhum momento se pensa na possibilidade de ingressos populares, de atividades envolvendo a massa da torcida e não apenas a minoria que pode pagar? Sim, minoria que tem muito dinheiro, é a desigualdade social ainda vigente no Brasil.

O ingresso mais barato do primeiro jogo do Corinthians na Libertadores custava 50 reais. A arquibancada no Rio está, em média, 40 reais. E paga-se pelo que, afinal? Para sentar num lugar não marcado, pela falta de segurança, pelo desrespeito da CBF com o esporte? O preço é mais salgado do que se pensa.

Não é de hoje que os serviços públicos (que já pagamos com nossos impostos) são deliberadamente sucateados para que nossa única opção seja pagar de novo por eles. Está aí a proliferação das escolas, universidades, planos de saúde e previdência privados que não me deixam mentir.

Agora essa mentalidade chegou ao futebol. Começou de forma sorrateira, mas agora está tão bem aceita que o presidente da Traffic pode falar abertamente sobre seus objetivos e estratégias. Ele está no seu papel. Ruim mesmo é quem permitiu que isso acontecesse com nosso esporte nacional.

E não seria um Renato Maurício Prado que levantaria numa entrevista pontos tão controversos. Esse já se esqueceu da máxima de Geneton Moraes Neto, de que o jornalista existe para fazer perguntas difíceis.

Mas faço questão de registrar os colegas de profissão que ainda não se renderam a esse determinismo financista que vem tomando conta do nosso futebol: André Rizek, Lúcio de Castro e Juca Kfouri são alguns deles. ATUALIZAÇÃO: Incluo na lista o Rica Perrone, depois desse excelente texto.

O futebol parece ser um mundo à parte. Enquanto o planeta passava por uma crise financeira em 2009, contratações galáticas eram feitas aqui e ali.  O Brasil é o terceiro no mundo em valor de patrocínios a clubes, dá pra acreditar? A própria FIFA é de um totalitarismo capitalista descarado.

Mas ao mesmo tempo, ele não é um mundo à parte. Os resultados e a postura em campo ecoam na alma do torcedor, na cultura nacional, pode até influenciar uma eleição. Tratar isso como um simples "produto" é diminuir seu significado.

domingo, 30 de janeiro de 2011

Finalmente um jogo "à vera"

Golaço e braços abertos para você, R10 (Jorge William/Globo)

Um dia os dirigentes do futebol brasileiro serão iluminados e verão que, para manter um campeonato estadual vivo e importante, devem encher o calendário de clássicos. Foi essa a receita de Mario Filho há mais de cinquenta anos. E pelo Vasco x Flamengo de hoje, dá pra ver que o caminho ainda é esse.

Porque não importa a situação do campeonato, os clássicos são um mundo à parte. É claro que ingredientes extras apimentaram o jogo antes de começar. O Vasco finalmente conseguiu derrubar o técnico e - incrível - pela primeira vez jogadores imprescindíveis como Dedé, Anderson Martins e Eduardo Costa estavam inscritos!

Por outro lado, era a oportunidade do Flamengo e de Luxa mostrarem que a evolução geral não é de mentirinha. E que os reforços poderiam enfim, ser reconhecidos como tal - ou não. Ou seja, tinha tudo pra ser um bom jogo, e foi.

Muita vontade e movimentação de ambas as equipes, cada uma mandando em um tempo do jogo. Se não terminasse a primeira etapa, o Fla partiria para a goleada. Se não houvesse o apito final, o Vasco empataria e poderia até virar o placar.

O grande destaque foi Thiago Neves, pois mostrou uma característica indispensável para qualquer jogador se dar bem no Fla: raça. Pressionou saída de bola, marcou, inverteu jogadas, deu passe com ambos os pés e fez um dos primeiros golaços do futebol brasileiro em 2011.

O Vasco não conseguia finalizar, coisa que se resolveu no segundo tempo. Com uma defesa mais sólida e a liderança e proteção de Eduardo Costa, tudo fica mais fácil. Até porque o time ganhou dois reforços de última hora.

O primeiro grande jogo também ratificou o que os empolgadinhos teimam em não ver: que as boas fases do zagueiro Wellinton têm prazo de validade (ainda precisa amadurecer. O lance do gol do Vasco veio de uma infelicidade sua); que Wanderley não tem cacife pra jogar num clube grande; que Marquinhos e Fierro não criam jogadas; que Felipe é tão presepeiro quanto Bruno, embora igualmente bom goleiro.

Ou então que Marcel só disputaria vaga com Wanderley, e num clube de médio pra pequeno; que Ramon esqueceu de jogar futebol; que Jefferson é camisa 10 de Série C; e que Zé Roberto ainda faz muita falta.

Parece que o preparo físico do Flamengo, devido talvez ao intenso ritmo da primeira etapa, faltou depois da parada técnica no segundo tempo. Renato é sério candidato a substituições frequentes, e Williams sabe tudo de desarme, e só.

Acredito que o Vasco se recupere na Taça Rio, desde que com um técnico decente e com uma diretoria firme. Demoraram demais pra peitar as estrelinhas apagadas, e isso reflete no trabalho como um todo.

O Fluminense ainda é o time a ser batido. Mas pelo que se viu contra Olaria e Cabofriense, quem faz o primeiro gol contra o tricolor complica demais a vida de Muricy. Até porque os times treinados por ele são armados pra fazer logo o resultado, e com frequencia ficam perdidos quando a situação é diferente disso. (Talvez aí esteja a razão do Zangado não ganhar nada em mata-mata.)

No retrovisor das Laranjeiras já surgem Botafogo e atrás, o Flamengo. Espero que o Vasco engrene para termos clássicos nas semifinais (ao menos da Taça Rio), pois só assim o campeonato fica mais interessante.

segunda-feira, 24 de janeiro de 2011

Doideira


O Botafogo vive dias de Flamengo desde o fim do ano passado. Depois de lidar com as indisciplinas de Jobson e com as mentiras de Somália, agora o clube precisa gerenciar a crise entre seu maior ídolo e artilheiro com o treinador que deu um jeito no time em 2010.

Só os resultados em campo vão dizer não quem tem razão, mas se Joel Santana dura no cargo. Pois a questão é delicada para a diretoria. Loco Abreu era o ídolo que o Botafogo precisava há tempos: confiante, goleador, líder. E o principal: sem o ranço da Era Cuca e seu derrotismo emocional.

Por outro lado, não há como negar o trabalho de Joel na arrumação tática do time no ano passado, assim como o jeito paternal de proteger o elenco após o 0x6 pro Vasco. E as "tiradas da cartola" diante do departamento médico lotado em pleno Brasileirão.

No entanto Joel possui um defeito que, cedo ou tarde, se revela em todos os times que treina: ele parece seguir à risca o "em esquema que está ganhando não se mexe". E se o perfil atual dos atletas e a incompetência da imprensa esportiva não permite olhares mais críticos, isso não acontece com o rodado Loco Abreu.

Se você ainda duvida, veja a carta do camisa 13 para esclarecer o ocorrido após o primeiro jogo do Carioca. Perceba que ele bota na conta do jornalista o telefone sem fio, mas mostra personalidade para admitir suas opiniões.

Loco é bem categórico ao dizer que a entrevista pós-jogo é mesmo a sua opinião, sem botar a culpa na "cabeça quente". E o que ele disse, afinal? O óbvio: que já passou da hora do Botafogo sair do espírito defensivista. Que serviu num contexto específico em 2010, mas que não necessariamente é o melhor agora.

Mas essa flexibilidade Joel não tem. Perguntem aos torcedores dos demais times cariocas: em determinado momento, todo mundo fica de saco cheio da mesmice dos esquemas defensivos do Natalino. Uma estratégia que funciona perfeitamente para os momentos em que ele chega nos clubes - apagando incêndio. Faz o time parar de tomar gols e consegue vitórias suadas. Como questioná-lo então?

Porém quando é a hora de evoluir, fazendo os demais times (principalmente os pequenos do Carioca) terem medo do Botafogo, Joel não quer mudar. Loco já percebeu isso, e parece não aguentar mais.

E agora, diretoria?

ATUALIZAÇÃO: Loco Abreu retirou a carta de seu site.

terça-feira, 11 de janeiro de 2011

Ronaldinho: vamos ao que interessa


Já que o Flamengo resolveu dar (mais um) tiro no pé fazendo censura prévia à imprensa na coletiva de amanhã, prossigo com meu intento de elencar aqui algumas questões e perguntas que deveriam ser feitas nesse momento.

Até porque o Globo Esporte de hoje foi patético. Mais preocupados em fazer média com a maior audiência do Brasil (o que não é novidade), todo o programa foi uma extensão do circo que se arrasta desde o fim do ano passado.

Patricia Amorim e Luxemburgo estiveram em links ao vivo e falaram o que quiseram: ela, sobre a recepção a Ronaldinho num tour por várias partes do Rio; o técnico, que estava com fome. Sim, com fome, pois Eric Faria tirou Luxa do almoço para a "exclusiva".

A única pergunta feita a Luxemburgo foi onde Ronaldinho iria jogar: no meio ou no ataque? "Vai jogar no time", respondeu ele, para gargalhadas de Eric Faria e de Alex Escobar no estúdio. Pois é. Precisa de censura prévia pra isso?

Dentro de campo

Como Ronaldinho vai se comportar dentro de campo? E isso inclui a dedicação aos treinamentos e à manutenção pessoal da forma física, antes de tudo. Dizem que não haverá privilégios, mas dá pra acreditar nisso num Flamengo pós-Adriano e pós-Zico (que queria acabar com esse tipo de coisa e foi "acabado")?

Ele será o camisa 10? Mas vem aí Thiago Neves, além de Botinelli. Vai pro ataque? Mas ficará restrito a determinada faixa de campo, como no Milan, ou terá liberdade? Quando Ronaldinho estará apto para começar uma partida e jogá-la inteira?

Fora de campo

Como é, afinal, essa parceria entre Flamengo e Traffic? Vai custar alguma coisa para os cofres do clube? Se não custar, qual o retorno para a empresa? O passe de jovens promessas que já despontam na Copa SP de futebol junior?

E as demais parcerias da Traffic, até mesmo com o Palmeiras: como ficam diante desse grande investimento no Flamengo? Quais são os termos dessa "relação aberta" entre a empresa, os clubes e agentes?

Essas são algumas perguntas que estão no ar. O resto é conversa pra torcedor ot... ops, apaixonado.

segunda-feira, 3 de janeiro de 2011

O homem incógnita


Enquanto Ronaldinho Gaúcho é oferecido no espeto a várias mesas pelo próprio irmão, ninguém está falando de uma questão crucial: que Ronaldinho voltaria a jogar no Brasil? Sim, haverá retorno de marketing, receitas, estádios enchendo para vê-lo... Mas e o resultado em campo, qual será?

Está certo que o auge de sua carreira já passou. Fez chover no Barcelona, foi campeão da Liga dos Campeões, disputou três Copas (vencendo a primeira), mas veio para o Milan em baixa. No tempo da solidão de Kaká no meio-campo da Era Dunga, seus lampejos voltaram a credenciá-lo para a Seleção. Teve uma boa fase, mas não se pode  dizer que era aquele Ronaldinho.

E talvez aí esteja o "pulo do gato" para que Ronaldinho volte a apresentar um bom futebol regularmente: reconhecer que não é mais aquele Ronaldinho. No programa Juca Entrevista, o ex-craque Sócrates deu a dica: "Ele precisa admitir que é humano, deixou de ser mito. Precisa se reiventar".

Foi o que os grandes jogadores brasileiros fizeram durante suas carreiras. A velocidade do início de Romário deu lugar ao "gênio da grande área". A explosão arrasa-quarteirão de Ronaldo foi substituída pelo "jeito Túlio" de jogar, estando na hora certa e no lugar certo, com o talento que não depende do físico. Ah, e ambos voltaram ao Brasil, o que torna tudo mais fácil.

Ao que tudo indica (sei lá...), Ronaldinho está voltando ao Brasil. Mas e o resto? Não adianta insistir nos malabarismos de sempre, já que fica notória a falta de eficácia no futebol atual. Neymar e Ganso já aprenderam que não adianta só rebolar, tem que ter bola na rede. Não adianta se iludir (e tentar iludir torcida e crítica) de que ainda é aquele Ronaldinho. É um preâmbulo para expectativas frustradas.

Se lembrar da sua boa fase esse ano no Milan, Ronaldinho poderá encontrar um novo rumo. Em vez da correria e das acrobacias, o camisa 80 se esmerou por lançamentos  milimétricos que deram várias vitórias ao time rossonero. Em outras situações, já perto do gol, tirou da cartola finalizações que seu talento ainda permite. Fora as perfeitas cobranças de falta.

Em suma: Ronaldinho Gaúcho precisa aprender que menos é mais. Principalmente no Brasil, que sofre com o êxodo de jogadores, ele tem que se dar conta que não é preciso muito para impressionar e resolver jogos, sem ficar pressionado por torcida e crítica. Além dos exemplos acima, Ronaldinho ainda pode lembrar de Adriano 2009.

E Ronaldinho ainda possui uma grande vantagem em relação à trinca citada: tem uma fisiologia que, treinando seriamente, consegue se manter bem nos 90 minutos. É agora ou nunca, dentuço.