sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

O que é de fato, ninguém tasca

Em 1987 eu tinha sete anos e colecionava meu primeiro álbum de figurinhas: o da Copa União daquele ano. Flamenguista, fiquei super feliz quando tirei o Bebeto, meu ídolo de então - ainda não tinha cabeça pra entender a importância de Zico, e o franzino camisa 7 era o fazedor dos gols que me alegravam.

Não lembro de muita coisa dessa competição, mas a final contra o Internacional, no Maracanã, não me sai da cabeça. Eu assisti pela TV, era um dia de chuva e o uniforme branco dos gaúchos ficava todo enlameado, assim como o calção branco dos jogadores do Flamengo.

Pelo Colorado, Taffarel já despontava como grande goleiro, Luís Carlos Winck se firmava na tradição de bons laterais-direitos do país. Do lado rubro-negro, o eterno camisa 10 era acompanhado do explosivo Renato Gaúcho, do jovem lateral-esquerdo Leonardo, então com 19 anos, do promissor Jorginho na lateral-direita. Além de Zé Carlos no gol, Leandro e Andrade ainda no Fla.

O jogo foi nervoso do começo ao fim, o 0 x 0 teimava em não sair do placar, até que Andrade enfiou uma bola milimétrica para o magrelo Bebeto dividir, já dentro da área, com Taffarel e outro zagueiro do Inter. Bola na rede. Fiquei preocupado, achando que meu ídolo tinha se machucado no lance.

O jogo seguiu, em determinado momento Zico foi substituído (lembro do seu calção todo sujo de lama, mesmo em fim de carreira não deixou de lutar em campo), a torcida ovacionava, Maracanã vermelho e preto lotado.

Fim de jogo, Flamengo campeão da Copa União de 1987. O que, como o álbum de figurinhas, a imprensa e a torcida de todos os times participantes tratavam à época, significava ser campeão nacional. Leonardo chorava no ombro de Zico, eu com meus sete anos me emocionava junto.

Só bem mais tarde fiquei sabendo da polêmica com o Sport, e ainda assim comemorei o hexa em 2009. Quem vai tirar o que senti em 1987? A CBF? Ricardo Teixeira? Patricia Amorim?

Todos esses vão passar, mas a sensação de um garoto vendo pela primeira vez seu time ser campeão brasileiro, não passou até hoje. E será sentida até por meus filhos.

Façam o que quiserem, digladiem-se politicamente, produzam mil dossiês. O Flamengo é campeão brasileiro de 1987 até que o coração de cada genuíno torcedor prove o contrário.

terça-feira, 21 de dezembro de 2010

Desperdício é isso aí


"Não rasgue o bilhete premiado da loteria!"

Assim o ex-craque e hoje comentarista Junior, olhando para a câmera, se dirigia a Jobson. O Globo Esporte tinha acabado de apresentar mais um relato sobre mais uma indisciplina da jovem promessa. O Cronista Esporte já abordou muito bem a questão de como os atletas jogam fora suas carreiras, usando como exemplo o atacante do Botafogo.

Mas queria falar de outro tipo de desperdício, talvez mais imperdoável do que o de Jobson e outros aspirantes a craques. Porque esses ainda têm o atenuante de serem jovens, ficarem mais facilmente deslumbrados, não saberem direito o que está em jogo - o que não os exime da responsabilidade.

Pior é quando um jogador já experiente e talentoso, com chance até de se firmar na Seleção Brasileira, parece fazer pouco caso do dom que recebeu. Por motivos diferentes, também rasgam seus bilhetes premiados.

Felipe, atualmente de volta ao Vasco, é um deles. Dono de um dos melhores passes do Brasil, depois de se destacar no meio-campo do Flamengo, chegou à Seleção. Mas os "chinelinhos", as indisciplinas e a falta de vontade para levar a sério sua profissão o reduziram a um injusto (no que diz respeito ao talento) exílio no Qatar.

Porém ainda há exemplos gritantes, como Adriano e Carlos Alberto. Desde o ocaso de Ronaldo a camisa 9 da Seleção está vaga. Luís Fabiano teve que superar muitas desconfianças para se tornar intocável com a amarelinha. E foi muito ajudado pela displicência do atacante da Roma, de quem sempre foi banco.

O tempo foi passando (e ainda está!), até Grafite foi pra Copa, Alexandre Pato não parece ser o matador característico... E o que faz Adriano? Briga com a Roma, faz molecagem, deixa-se levar pelas possibilidades de retorno aos clubes brasileiros... Se despertasse de uma vez por todas, nunca o "poste" Borrielo seria titular no clube romano. E ainda não surgiu outro centroavante para o Brasil. Até quando Adriano vai ficar brincando com a sorte?

O mesmo para Carlos Alberto. Abstraia a fama que ele criou e sua inconstância. A verdade é que o meio-campo do Vasco sabe armar o jogo, dar passes milimétricos, é difícil tirar a bola dele. Ou seja, sabe jogar. Com a ausência de Ganso, falta um camisa 10 na Seleção. Se Carlos Alberto acordasse, poderia ao menos sonhar com essa possibilidade.

Além disso, é destro. Talvez jogasse até com Ganso, dependendo da situação de jogo. Ou seria um reserva imediato (se até Douglas foi testado...). Mas parece satisfeito em ficar metade do ano sem jogar e com o currículo que acumulou até o momento. Não se vê em Carlos Alberto, ainda com 25 anos, o brilho nos olhos de jogar pela Seleção.

Pra mim, esses são os casos mais emblemáticos dessa malemolência preguiçosa que não permite o despontar de carreiras vitoriosas como poderiam ser. Adriano e Carlos Alberto, se esforçando um pouco, conseguiram trazer títulos nacionais para seus respectivos clubes sendo os principais jogadores. O que não fariam com disposição total?

E você? Lembra de outros casos clássicos de desperdício?

domingo, 12 de dezembro de 2010

A saia justa de Conca


Sabe aquela do marido traído que, ao descobrir a esposa com o amante no sofá, resolve tomar uma atitude pra resolver a questão? Ele tira o sofá da sala e acha que fez o que tinha que fazer. Foi a mesma situação que o argentino Conca provocou ao se destacar como o melhor jogador em atualidade no Brasil, inclusive trazendo resultados, como o título de campeão brasileiro.

Com Paulo Henrique Ganso no estaleiro até 2011, a pergunta que ficou no ar (e que foi respondida pelo atleta portenho) é: quem mais pode ser considerado um autêntico camisa 10 nos gramados tupiniquins?

Outros dois argentinos foram lembrados, como Montillo e D'Alessandro. Mas eles não são aqueles meias-armadores que deixam os atacantes na cara do gol enquanto permanecem no círculo central. Os jogadores de Cruzeiro e Internacional carregam a bola até o ataque, para aí sim dar a assistência final e até mesmo concluir com a bola na rede.

É claro que Conca também aparece na frente e faz seus golzinhos, mas seu estilo de jogo é levantar a cabeça e dar aquele passe milimétrico que deixa qualquer defesa "vendida". O meio-campo tricolor não corre, e nem precisa: faz a bola correr pra onde quer.

Então, depois de ganhar todos os prêmios possíveis e imagináveis pelo seu desempenho em 2010, outra pergunta ficou no ar mas ninguém ousava pronunciar. Até que o próprio Conca resolveu se naturalizar brasileiro. Deixou a imprensa esportiva de saia justa, praticamente obrigando-a, muito a contragosto, a levantar o tema: o argentino tem vaga na Seleção Brasileira atual?

As reações foram como a do marido traído. Teve jornalista que chegou a dizer que há outros melhores que Conca, como Lucas, do São Paulo, ou Bruno César, do Corinthians. Ah, o jornalista era do Estadão...

O constrangimento grassava no ar. Afinal, o Brasil está sem um autêntico camisa 10, com exceção de Ganso. Isso ficou claro para o mundo quando Mano Menezes tentou Ronaldinho Gaúcho e o pobre-coitado Douglas na posição - diante da Argentina, vejam só. O próprio treinador foi mais sincero do que muita gente.

São muitos os motivos que nos trouxeram a essa situação (não ter um camisa 10): falta de trabalho na base, mau aproveitamento dos potenciais armadores quando chegam ao time profissional, êxodo recente.

Mas a resposta que ninguém admite dar é que Conca tem sim, lugar na Seleção, por nada mais, nada menos que atender a uma carência (talvez momentânea). Não é porque ele é argentino que vou deixar de admitir essa verdade escancarada.