sábado, 28 de dezembro de 2013

A marcha do progresso

Uma família estava à minha frente no Jogo das Estrelas, ontem, no Maracanã. A alegria de estarem ali, torcendo pelo time de Zico como se fosse o próprio Flamengo, era contagiante e autêntica. Visivelmente eram torcedores mais humildes, daqueles bem representantes do povão, cujo chinelo de dedo era a marca registrada. Então me dei conta que eu não vejo mais esse tipo de torcedor nos jogos do clube mais popular do Rio. Muito já se falou sobre isso, mas pela primeira vez eu sentia quase na pele o apartheid das novas arenas padrão FIFA.

Não vou negar as vantagens do novo Maracanã, já defendidas neste blog. Tampouco serei mais um a fazer tratados de economia sobre ingressos, lei da oferta e da procura, direitos do torcedor-consumidor. Vou falar do que sei, apenas. O que sei é que, em seis meses do novo Maracanã, não vi torcedores como aqueles. E só voltei a vê-los quando o ingresso inteiro custava 20 reais e a meia, dez.

Os custos das novas arenas são altos, os clubes não podem abrir mão de receitas que são revertidas para o próprio espetáculo, as gratuidades e meias-entradas são uma farra populista... Sei disso tudo. Mas também sei que, em seis meses do novo Maracanã, não vi torcedores como aqueles. E só voltei a vê-los quando o ingresso inteiro custava 20 reais e a meia, dez.

O pai da família, de boné e camisa vermelha, vibrava a cada gol e jogada do time de Zico como se não houvesse amanhã. Talvez fosse isso mesmo. Eu me pergunto, sem provocação, se quando o ingresso voltar ao preço mínimo de 40 a 60 reais ele estará ali de novo com esposa e dois filhos.

Mas não era só ele. Até a menina mais nova pulava e entoava os gritos da torcida a plenos pulmões, acompanhada da mãe e do irmão. Eu não sei aonde eles moram, mas quando cantamos "festa na favela", uma feliz apropriação de um xingamento que os flamenguistas sofriam, vi aquela família cantar com orgulho.

Não descarto que essa interpretação subjetiva que faço seja fruto de uma idealização pequeno-burguesa. Mas sei que, em seis meses do novo Maracanã, não vi torcedores como aqueles. E só voltei a vê-los quando o ingresso inteiro custava 20 reais e a meia, dez.

Também não quero cair no preconceito inverso, achando que os torcedores que têm grana pra frequentar as novas arenas não são torcedores, ou que devam se sentir culpados por isso. O futebol, como já apontou um cronista esportivo (cujo nome me foge à memória), surgiu como um esporte de elite que a antropofagia brasileira popularizou. Talvez o capital, via grandes eventos, esteja levando o velho ludopédio de volta a seus primórdios. Não sei dizer.

O que sei é que, em seis meses do novo Maracanã, não vi torcedores como aqueles. E só voltei a vê-los quando o ingresso inteiro custava 20 reais e a meia, dez. E estou triste por pensar que não poderei vê-los novamente tão cedo, e que não poderão desfrutar do prazer que desfrutarei. É só isso que sei.

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