sexta-feira, 19 de março de 2010

A quase vitória dos chatos

O Chelsea quer levar Neymar. Estava demorando que voltasse a aparecer uma proposta milionária pelo craque da Vila Belmiro - a primeira veio do Real Madrid, antes da fama, tentando um projeto "Messi 2". Não me surpreenderia se o garoto quiser mudar de ares, mas por motivos bem diferentes da maioria dos seus contemporâneos.

Neymar tem apresentado maturidade em forma de frieza dentro de campo. Ainda em seus 19 anos não sente o peso de ser uma estrela, o principal jogador, o mais visado pelos marcadores e pelas cobranças em geral. Seja diante de um timeco ou num clássico, Neymar é sempre o mesmo: parte pra cima, não se intimida, faz gol, dribla, firula e tudo o mais.

Só que desde que humilhou o time de segunda maior torcida do país, Neymar passou a ser patrulhado como nunca antes. Se o chapéu em Chicão foi desnecessário e irritou, quando o santista justificou-se dizendo que fez porque "deu vontade", aí é que o moralismo hipócrita e subalterno não o deixou em paz.

Em vez de fazerem como o time do Palmeiras - revidando a provocação na mesma moeda, com gols e dancinhas - todo o resto do Brasil usou dos mais variados argumentos para que olhássemos Neymar como um inconsequente. E que em breve ia pagar o pato, quem sabe até fisicamente.

Fiquei impressionado em ver como a crítica esportiva e seus protagonistas se habituaram a, veementemente, condenar a malemolência brasileira que sempre existiu no futebol. Não se pega no pé dos técnicos que mandam bater, nos árbitros que não coíbem a violência, nos dirigentes que não honram as dívidas dos clubes... A bronca é sempre maior com quem joga o tal futebol bonito.

E aí Neymar vai jogando, sendo patrulhado por árbitros, marcadores e até colegas goleadores que já passaram pela mesma coisa (Ronaldo). A expulsão diante do Palmeiras, depois de apanhar o jogo inteiro, parece ter sido o primeiro momento em que o garoto cedeu à pressão. Nada mais natural.

Mas já querem dar um gancho de 18 jogos, como se ele fosse o único atleta atual a falar desaforo para o juiz.

Assim, se os demais garotos de sua idade querem ir pra Europa para se destacar mundialmente e ganhar mais dinheiro, Neymar pode ter mais um motivo pra cair fora do país: está sendo muito penoso para o santista ser ele mesmo.

Ou Neymar deixa de ser Neymar e começa a jogar um futebol "mais do mesmo" - sem ousadia, picardia e chiadeira contra a violência - ou ele não serve para o cenário atual do futebol brasileiro. Porque na onda troglodita que se apodera de nossos campos e estádios, não vai faltar gente querendo que alguém "dê uma lição" em Neymar. Ou que tudo o que ele faz é apenas firula sem propósito.

Talvez em um cenário mais civilizado (e não estou sendo eurocêntrico) Neymar possa exibir sua arte e ser aplaudido por todas as torcidas - como acontece com Messi, Tevez ou Cristiano Ronaldo por onde quer que passem. Que Neymar encontre um lugar onde ele possa ser sempre Neymar.

É curioso: parece que o futebol brasileiro só tem chance de sobreviver ao se afastar de suas paragens. A mentalidade coronelista e colonialista continua reinando, levando Neymar e assemelhados para o sacrifício.

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